segunda-feira, 16 de julho de 2007

Etanol

O Brasil e a Arábia Saudita
O Estado de S. Paulo

Por José Goldemberg

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A produção brasileira de álcool já substitui 40% da gasolina usada no País. Para isso são usados 3 milhões de hectares de terra, o que é pouco comparado com a área total usada para a agricultura no Brasil, que são 60 milhões de hectares.

Dobrar ou triplicar a produção de álcool no Brasil é factível e poderá ser conseguido em cerca de dez anos, sem causar grandes problemas ambientais, porque existem no País dezenas de milhões de hectares de áreas degradadas nas quais a agricultura se poderia expandir. Só no Estado de São Paulo são 10 milhões de hectares de pastagens, onde são criados bovinos que têm à sua disposição um hectare por cabeça, ou seja, um campo de futebol. Outra opção é aumentar a produtividade da cana-de-açúcar nas áreas em que já está implantada, sem a necessidade de expandi-las.

Basta aumentar um pouco a densidade do gado no solo para fazer isso sem o risco de empurrá-lo para a Amazônia. Já o cultivo da cana-de-açúcar no Pantanal e em certas áreas de Mato Grosso e Minas Gerais, contudo, pode necessitar de cuidados especiais e o Ibama precisa ficar vigilante para que abusos que desmoralizem o programa não ocorram.

Os países que produzem álcool a partir do milho, como os Estados Unidos, ou da beterraba e de cereais, na Europa, sabem muito bem disso e estão preocupados porque o etanol brasileiro poder ser produzido pela metade do custo daquele outro. Importar álcool do Brasil vai inviabilizar sua produção nesses países. Esta é a origem das restrições à importação de álcool do Brasil, que se manifestam de três formas:

A produção de álcool vai gerar fome no mundo porque vai substituir a produção de alimentos - o que é absurdo quando se olha a área que está sendo dedicada à cana-de-açúcar no Brasil para a produção de álcool, menos de 5% do total. Este é, porém, um sério problema nos Estados Unidos, onde a expansão da produção do milho em áreas antes ocupadas por soja está provocando aumento no custo desse cereal.

Haverá danos ambientais inaceitáveis, como a destruição da floresta amazônica - sucede que a cana-de-açúcar não cresce bem na Amazônia. Poder-se-ia argumentar que a expansão da cana em pastagens vai empurrar o gado para a Amazônia, mas isso não é necessariamente o que vai ocorrer, como se viu acima, pois a substituição poderá ser feita em áreas de pastagens, aumentando a densidade de ocupação pelo gado e liberando assim novas áreas para a cultura da cana.

Na realidade, produzir álcool apenas disfarça o problema, pois se gasta muito combustível fóssil para produzi-lo; portanto, o álcool não seria, de fato, um combustível renovável - este é o caso quando se usa o milho ou outros cereais para produzi-lo, mas a situação com cana-de-açúcar é realmente muito mais favorável: para cada litro de combustível usado se produzem quase dez de álcool.

Nos Estados Unidos ou Europa, uma unidade produtora “importa” combustíveis fósseis para o processo de produção do álcool. No caso do Brasil, usa-se como fonte de energia o bagaço de cana, do qual se obtêm o calor e a eletricidade necessários ao processo de preparação do álcool, desde o esmagamento da cana até a destilação do produto final, aliás, como se fazia em pequena escala nos velhos alambiques que faziam cachaça. Uma destilaria no Brasil não “importa” energia e até“exporta” o excedente, vendendo eletricidade às distribuidoras de energia.

Em conclusão, o que se pode dizer é que, graças à disponibilidade de terra e a um clima favorável, o Brasil poderá ser um grande produtor de álcool - talvez duas ou três vezes a produção atual - sem grandes problemas de competição com outras culturas e sem gerar sérios problemas ambientais.

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